O ano de 2019 marca o aniversário de 25 anos da principal conquista do basquete feminino do Brasil: o título do Mundial de 1994, do famoso time de Hortência e Paula. Mas, depois de um quarto de século, aquele momento parece uma lembrança quase completamente descolada da realidade atual, como uma foto de infância com a hashtag #tbt no Instagram (embora, é verdade, haja registros que têm laços bem definidos com o presente).
Pouco a pouco, a seleção foi se ausentando da primeira classe das grandes competições, até chegar ao fundo do poço recentemente. Foi da medalha de prata nos Jogos Olímpicos de Atlanta, em 1996, à campanha pobre dentro de casa na Rio 2016, eliminada na primeira fase com cinco derrotas em cinco jogos. Paralelamente, foi da glória máxima no Mundial de 94 à inacreditável não-classificação à edição de 2018. Bom, se um século é, no fundo, quatro ciclos de 25 anos, pode ser a hora de corrigir o curso dessa trajetória.
Um bom prenúncio disso foi a contratação do super vitorioso técnico José Neto, quatro vezes campeão do NBB e comandante do título intercontinental de clubes de 2014, tudo pelo Flamengo. Neto também fez parte da comissão técnica da seleção masculina por 12 anos, com destaque para o período de renascimento da equipe, sob o comando do argentino Rubén Magnano. ‘Zé’ Neto foi contratado em maio e já chegou mostrando as credenciais, com a conquista da medalha de ouro nos Jogos Pan-americanos de Lima, em agosto.
O Brasil não chegava lá desde 1991, um pouquinho antes do recorte de 25 anos, mas quando a equipe já tinha como base as atletas que fariam tanto sucesso nos anos seguintes. Agora, na sequência do título no Peru, o próximo desafio, que começa nesse domingo (22) em Porto Rico, é a AmeriCup. Em bom português, a Copa América. O ouro no Pan traz otimismo, mas não pode mascarar uma realidade que ainda é dura.
José Neto levou para a Copa América 12 jogadoras, a maioria já presente no elenco que foi bem no Peru. São quatro jogadoras da liga norte-americana (WNBA) ou de clubes da Europa, os principais centros do basquete mundial. Neto gostaria de contar com atletas que atuam no basquete universitário dos Estados Unidos. Jogadoras como as pivôs Stephanie Soares e Izabel Varejão (sobrinha de Anderson Varejão), de apenas 19 anos, seriam adições consideráveis ao time, mesmo com tão pouca experiência. Nenhuma delas foi liberada para atuar. Com isso, o técnico acabou recorrendo a oito atletas da liga brasileira, a LBF. Um reconhecimento possibilitado pela necessidade.
A LBF ainda tenta se estabelecer como competição de grande porte no cenário esportivo do Brasil. Tem pouquíssimo espaço na grade televisiva. Começou em 2010 e em nenhuma das nove edições teve mais do que dez clubes participantes. A edição de 2016-2017, por exemplo, teve apenas seis equipes na disputa. A última temporada contou com um time originado de uma liga amadora, em que as atletas tinham que exercer outras atividades para obter uma renda digna. Enquanto o NBB impõe regras para quem quer jogar a principal competição do país, a LBF fica grata se mais postulantes puderem aparecer.
É com essa equipe que o Brasil joga a Copa América, cujo maior chamariz é ser a via de acesso ao torneio pré-olímpico das Américas, que vai ser disputado em novembro. Só que o sarrafo não é muito alto: oito das dez equipes da AmeriCup vão chegar lá. Dali em diante, começa a apertar: os quatro primeiros chegam aos pré-olímpicos mundiais, em fevereiro de 2020. Lá, estarão em jogo dez vagas para a Olimpíada de Tóquio.
José Neto acha que é complicado pensar lá no Japão antes de se concentrar no que vai acontecer em Porto Rico. Mas é inegável que uma boa participação ou a simples presença nos Jogos de 2020 pode ser a guinada de autoconfiança que a seleção precisa. Em 2019, as fotos não se apagam ou rasgam mais. O registro virtual fica para sempre. Mas não significa que não seja necessário, ou saudável, produzir novas memórias. E quanto antes os bons resultados deixarem de ser material para #tbt e voltarem a ser vivos, atuais, presentes, melhor para o Brasil.