Luiz Carlos Merten
Logo no começo de Conspiração e Poder, Cate Blanchett, como Mary Mapes, vai a um advogado. É jornalista, produtora do prestigiado programa 60 Minutes, e tem problemas por causa de uma reportagem com denúncias contra o presidente George W. Bush. Antes mesmo que comece a narrativa – o flash-back – que vai contar a história para o público, Mary pergunta se o advogado acredita nela. A resposta só virá bem mais tarde. O marido também passa o filme convidando a mulher para uma caminhada no fim de noite e só no fim… Veja para ver o que acontece.
Conspiração e Poder chama-se, no original, Truth/Verdade. É uma adaptação do livro Truth or Duty: The Press, the President and the Privilege of Power, de Mary Mapes, de 2006. Os fatos narrados referem-se a 2004. Depois de expor ao mundo as torturas no presídio de Abu Ghraib, Mary pesquisava, para o 60 Minutes, uma denúncia sobre o envolvimento da família Bush com Bin Laden. O então presidente tentava a reeleição, e surgiu outra denúncia – de que ele havia usado favorecimentos para não servir no Exército no Vietnã.
A matéria foi ao ar e, logo em seguida, contestada. Seria embasada em depoimentos falsos e documentos forjados. Quem apresentara o programa fora Dan Rather, um dos jornalistas mais respeitados dos EUA. As suspeitas foram todas direcionadas para a produtora e Mary Mapes foi massacrada pela rede de TV CBS. Levantaram sua vida – sofrera abuso do pai, virara uma radical e teria direcionado seu ódio para o presidente. A CBS criou uma comissão para investigar o caso. Todos ao redor de Mary foram sendo perseguidos e expurgados.
O filme é interessante, levanta questões pertinentes sobre o exercício da profissão do jornalista – e sua vulnerabilidade. Dan Rather, que já é um veterano – e Robert Redford traz sua persona para o papel -, reflete sobre as mudanças do jornalismo, que começou como de utilidade pública, mas se tornou rentável e foi incorporado à área de entretenimento das redes.
Tudo isso é relevante, válido e o diretor James Vanderbilt, também autor do roteiro, desenvolve o relato de forma a que nos identifiquemos com Mary, que, afinal, é uma grande profissional e uma mulher decente. O problema é que as dúvidas durante o processo foram sendo relegadas a segundo plano. O principal documento foi redigido num Microsoft, que não havia na época, mas Mary e seus checadores aceitaram alegações de que havia máquinas que poderiam etc., etc. O espectador não é induzido a confiar. Permanece a dúvida.
Face a isso, o privilégio do poder – a presidência? Os interesses das empresas? – encarrega-se do resto. É interessante comparar a imprensa do filme com a do Brasil atual, em que a presidência também está colocada em xeque. Onde está a conspiração do título? Na jornalista, aparentemente, não. Na empresa? A CBS não exerceu nenhuma pressão contra a equipe, mas se recusou a divulgar campanha promocional para que Cate Blanchett e Robert Redford concorressem ao Oscar.
Ator já viveu outros dois jornalistas – Sua grande fase de galã já passou, mas, aos 79 anos, Robert Redford segue sendo uma figura carismática. Em 2016, completam-se 40 anos de Todos os Homens do Presidente, em que Redford fez seu primeiro jornalista: Bob Woodward, do caso Watergate. Em 1996, criou outro jornalista de TV – em Íntimo e Pessoal, mas o que importava era o romance com Michelle Pfeiffer, de quem se torna o mentor.