Originária de milhares de anos, política, numa conceituação moderna, é a ciência moral normativa do governo da sociedade civil. Podemos eleger como conceitos básicos da ciência política as ideias de cidadania, cidade, direito e Estado, que é a tentativa de delimitação das noções de poder amplamente difundidas na sociedade. No Brasil, com raríssimas exceções, há décadas política é sinônimo de corrupção, cuja definição é o uso de poderes por parlamentares e/ou funcionários do governo para ganhos privados ilegítimos. Infelizmente, a roubalheira na Terra Brasilis é endêmica e acaba por afetar diretamente o bem-estar dos cidadãos ao diminuir investimentos públicos na saúde, educação, infraestrutura, segurança, habitação, entre outros direitos essenciais à vida.
Diriam os mais inteligentes – talvez os menos céticos – que políticos são indesejáveis. Entretanto, não reagem quando ouvem as afirmações dos mais realistas, para os quais eles (os homens públicos), a exemplo de determinados conglomerados, fazem parte da máxima do mal necessário. Um dos maiores filósofos de todos os tempos, o grego Platão, tinha como frase de cabeceira a que estabelece a política e as relações de poder como o meio possível de se modificar a sociedade. Também filósofo dos bons, Aristóteles jamais escondeu seu posicionamento acerca do conceito doutrinário do tema. Segundo ele, todas os vínculos são políticos, inclusive entre pais e filhos, vizinhos, governantes e governados.
Portanto, é direito de cada um não gostar de política, de políticos ou de uma empresa de comunicação. Eu tenho ojeriza a alguns, mas pessoal e profissionalmente tenho de conviver quase diariamente com todos. Novamente recorro a Platão. Em uma de suas numerosas teorias, ele pregou que “não há nada de errado com aqueles que não gostam de política. Esses serão simplesmente governados por aqueles que gostam”. Acrescentou que “o castigo dos bons que não fazem política é ser governados pelos maus”. Em resumo, o preço a pagar pela sua não participação na política é ser governado por quem é inferior. Nesses últimos dias, o maior exemplo de rendição à política dos poderosos partiu do presidente da República, cuja soberba e “modus grosseiros” sempre o impediam de recuar diante da eminência de perda de robustez. Como se o recuo fosse sempre uma derrota.
Obrigado a manter discursos que, acredito, objetivam unicamente agradar seguidores tacanhos, recentemente Bolsonaro deve ter desagradado ferozmente o pessoal do cercadinho ao autorizar (ele não anunciou) a Secretaria Especial de Comunicação (Secom) a aumentar os repasses de verbas publicitárias à Rede Globo, em detrimento das TVs religiosas. Considerada a principal inimiga da gestão Bolsonaro, a emissora da família Marinho voltou a ocupar o primeiro lugar no din din oficial, superando Record e SBT. Até o início de novembro, a bolada alcançou R$ 54 milhões, contra R$ 33,3 milhões de 2019. Ou seja, a TV Globo é lixo até certo ponto.
O incômodo é muito maior do que o lucro da briga com a rede, principalmente porque, como nas votações secretas, os denominados bolsominions publicamente afirmam assistir a concorrência, mas, no escurinho do lar, jamais deixaram de sintonizar a TV do Plim Plim. É como disse Onário, nada melhor do que um dia atrás do outro e uma noite no meio para que determinadas decisões sejam repensadas. Quem sabe o governo não esteja pensando em criar o programa Rede Globo, Minha Vida. Antes de partir, Steve Jobs também deixou seu recado para os que se acham superiores: “Não deixe o ruído das opiniões dos outros abafar sua própria voz”. Às vezes, a necessidade nos obriga a dar uma no cravo e outra na ferradura. Resumindo, ficar em cima do muro.
Não posso deixar de citar o inesquecível Ulysses Guimarães, para quem a política sempre foi a arte do possível. Dr. Ulysses despareceu, mas suas teses permanecem vivas em cada coração que pulsa política. É a verdadeira prova de que a criatividade é mesmo a inteligência se divertindo. Vamos aguardar os próximos passos de Jair Messias no rumo dos Marinhos, que terão de renovar a concessão da TV Globo em 2022. Improvável que isso não ocorra. Devemos ter sempre em mente que, tanto nos governos ditatoriais quanto nos de esquerda, a família nunca esteve longe do poder. Isso também é política, a política do cofre sempre cheio.