O medo é algo intrínseco a todos nós. Sabemos que há os destemidos, todos, aliás, fingidos de uma sociedade hipócrita. Por conta disso, qualquer um de nós poderia afirmar que a fragilidade humana nos aproxima, ao mesmo tempo em que nos afasta.
Como somos todos medrosos, isso nos une. Entretanto, nossos medos não são congruentes. Há pessoas que morrem de medo de barata, aranha, cobra e até mesmo de ursos-polares, mesmo vivendo ao Sul da linha do Equador. Também não podemos deixar de apontar para vários indivíduos receosos de escuro, fantasma, assombração, ou seja, de coisas místicas.
Aqueles que acompanham meus escritos sabem que sou casado com a Dona Irene. Pois bem, apesar de ela ser flagrantemente muito mais corajosa que eu, minha esposa tem lá alguns pavores. Um deles é de barata, como grande parte da população mundial. Outro, no entanto, é algo mais peculiar: chuva.
E lá estávamos nós dois dormindo na fazenda que tivemos em Goiás, quando começou a chover toda a água do Céu. Com certeza, São Pedro havia deixado todas as torneiras abertas, talvez por descuido, talvez até para provocar medo na minha amada. Tudo por implicância!
Como tenho sono de pedra, não percebi aquele desperdício de água caindo sobre o telhado. Era um temporal, obviamente acompanhado de raios e trovões. A Dona Irene, completamente em pânico, me cutucou até que conseguiu me despertar.
– Oi, amor, o que foi?
– Dudu, está chovendo.
– Hum. Vamos dormir.
– Pede pra chuva parar!
– Chuva, para.
Aqueles olhos assustados, quase escorrendo lágrimas, aguardavam ansiosamente por aquele milagre. É claro que o meu pedido não surtiu efeito. Por isso, olhei para a minha mulher e disse: “Não parou”.
Ela me abraçou e assim permanecemos até o amanhecer. O dia estava lindo. A Dona Irene me puxou para fora da casa e fomos passear. Todos os passarinhos pareciam ter feito o mesmo, pois eram nítidos os sons daquela orquestra. Quanto ao São Pedro, creio que ele iria ter um treco, pois a conta d’água seria alta naquele mês.