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Bom e mau humor

Trepar e chupar faz palavra ter dupla interpretação

Publicado

Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo - Foto de Arquivo

Pior do que as palavras com duplo sentido é ler ou entender conforme nossas conveniências o que está escrito ou o que se ouve. Antes que comecem a arrancar os pelinhos da sobrancelha e a tirar água do joelho, afirmo que a malícia está nas mentes poluídas daqueles que optam por captar o que não deveria. Às vezes, sou um desses. Por exemplo, durante uma visita a um sítio de cultura da jabuticaba me surpreendi com as placas afixadas em cada uma das dezenas de árvores frutíferas: “Só trepar para chupar”. Óbvia a recomendação, mas vi senhoras menos recatadas sorrindo pelo canto da boca e outras mais pudicas furibundas com o suposto desrespeito do pobre latifundiário.

Foi preciso a filha do proprietário trepar em uma das jaboticabeiras para explicar o que estava claro. É a tal da semântica. Só para lembrar, já contei por aqui a história do português que, ao passar em frente a um chaveiro, leu: “Trocam-se segredos”. O gajo parou, pensou, olhou para os lados, chamou o balconista e cochichou: “Eu sou gay. E você?” Posso até ser mal interpretado, mas acho que chamar a atenção para palavras e ideias de duplo sentido significa muito mais mexer com a imaginação dos mal-intencionados do que somente testar a capacidade inventiva dos que adoram reunir familiares e amigos para brincar de adedonha para adultos nas noites chuvosas.

É claro que, me antecipando às perguntas sensitivas e virtuais, é recomendável pesquisar o tipo de terreno em que se está pisando. Eu já fui expulso de alguns recintos virtuosos e pudendos da boca para fora. Não voltei, mas tenho certeza de que ainda hoje o pudoroso casal que me excomungou pesquisa a respeito do que começa com C, é enrugado e todo ser humano tem na parte de trás. Nada do que estão pensando. É somente o cotovelo. A expulsão sem aviso prévio ocorreu quando perguntei o que as mulheres têm no meio das pernas. Não tive sequer tempo de responder que são os joelhos.

Estranhamente, um evangélico ortodoxo que me ouviu sussurrar uma indagação a uma de suas ovelhas quis que eu repetisse a pergunta em voz alta. No microfone do púlpito principal, indaguei aos presentes o que entra duro e seco e sai macio e úmido. Para minha surpresa, um menino claramente da quinta série levantou-se e respondeu: “Um chiclete”. Absolutamente certo. Me sentindo em casa, ameacei desfiar meu rosário. Comecei pela primeira coisa que um homem coloca na mulher quando se casam. Na sequência, pulei para o que é cabeludo e sempre escapa do pijama durante a noite. Antes que pudesse me manifestar, novamente fui convidado a me retirar da casa de Deus.

Da porta de saída, gritei que o que o homem põe é o anel e o que sai é a cabeça. Portanto, nada de sacanagem. Depois de alguns dissabores, optei pela escrita para lembrar aos mais próximos que meu aprendizado bobagento é decorrente da leitura quase diária do dicionário, cujas palavras mais complicadas eu interpretava conforme minhas convicções. Tenho definições para termos popularescos do tipo salamaleque, piripaque, serelepe, siricutico, borogodó, beleléu, balacobaco, faniquito, quiproquó, mequetrefe, xilique e mixaria, entre outros. Um dia eu conto. O que não consigo definir como normal ou anormal é a forma como as pessoas interpretam o que ouvem de acordo com o humor ou com a dor do momento.

Tempos atrás quase apanhei de um ex-parceiro ao informá-lo que, para mim, qualquer amigo valia ouro. Descompensado, o camarada partiu para as vias de fato achando que eu completaria a frase dizendo que, caso o derretesse, ele daria o anel. Como não tenho telhado de vidro, também já escorreguei no quiabo e cai na esparrela de entender errado o que ouvia. Na informalidade, um vizinho suburbano me disse um dia que, antes de se casar, tivera um rala e rola com a esposa. E você? Surpreso com a rapidez da pergunta, respondi secamente: Eu também, mas não sabia que ela ia se casar com você. Sinto muito. Até hoje não sei como sobrevivi. Eis a razão pela qual nunca mais esqueci a máxima de que conversa que não entendo, “é minhoca lá”. Entenderam? Não? Então, é mió calá!

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*Wenceslau Araújo é Editor-Chefe de Notibras

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