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Terra do sambão

Trump não vem para matar, mas para negociar uma fatia do que a China já tem

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Autor/Imagem:
Wenceslau Araújo - Foto de Arquivo

Diz o bom e velho ditado que o que não tem remédio, remediado está. Ou seja, não adianta chorar, reclamar ou espernear. Quando não há solução para algo, o melhor a fazer é deixar como está e esperar por dias ou ocasiões melhores. Nos Estados Unidos, o republicano Donald Trump ganhou, levou, assumiu e da Casa Branca só sai se os democratas tiverem mais peso e força em 2029.  Sua posse não prejudicou meu sono vespertino, muito menos o noturno. Pelo contrário. Dormi o sono dos justos, principalmente porque sou brasileiro, não devo nada aos norte-americanos, não sou bajulador de Trump e não penso em fugir ou me mudar para os EUA.

Não posso dizer o mesmo dos ditos aliados brasileiros do novo presidente norte-americano, também conhecidos por aduladores testiculares de carteirinha de Trump. A maioria deles achou que bastava Joe Biden desocupar o principal assento da Casa Branca para que o mestre Donald desbancasse Luiz Inácio, fechasse o Supremo Tribunal Federal, mandasse prender Alexandre de Moraes, devolvesse o passaporte de Jair Messias e, de quebra, revogasse a inelegibilidade do ex-presidente tupiniquim até 2030. Sei lá, entendem, mas os inocentes daqui são muito mais inocentes do que os de lá.

Qualquer um tem o direito de viajar na maionese e prometer subir aos céus sem escada. Eu diria que, na atual conjuntura mundial, é mais fácil chegar ao inferno. Discursos milagrosos, inalcançáveis e xenófobos à parte, o fato é que Trump voltou a ser o cara. No Brasil, a situação não é diferente. Mesmo contrariando os fãs de arquibancada do magnata estadunidense, a atual liderança nacional só deixa a cadeira palaciana se os representantes dos “patriotas” tiverem mais votos em 2026. Não há outra hipótese. Nem a força política e econômica de Trump pode mudar o que está posto.

Na terra do sambão, onde, às vezes, a galinha cisca para frente, o pagode é na palma da mão. Além de não ser mais o Haiti, faz tempo que o Brasil não é mais a casa da Mãe Joana. Portanto, os que desde ontem estão nos portos e bases aéreas brasileiras esperando a chegada dos navios e aviões de guerra dos EUA devem dormir menos tensos, pois, embora supostamente aliado ideológico do expressivo estrato antidemocrático que ainda atrapalha o sono dos democratas, o Brasil não é prioridade para o novo presidente norte-americano. Em síntese, durmam em paz, porque Trump não vem para matar.

Vale lembrar que, no sentido da intromissão político-ideológica, não será nunca. Dirão os “patriotas” que, ao trabalhar para evitar o golpe de 2022, Joe Biden se intromete de garfo, colher e faca na política brasileira. Para os menos radicais, o ex-presidente não priorizou o Brasil de Lula da Silva. Ao despachar emissários pesos pesados para informar que os seus Estados Unidos não apoiariam uma ruptura institucional, Biden apenas colocou os interesses dos EUA acima dos seus. Portanto, muito mais do que os generais legalistas, ele é o grande mentor da manutenção da democracia no país.

Não sei se, à época, Donald Trump faria o mesmo. Os bolsonaristas têm certeza de que sim. Por conta da legalidade, dos custos e dos benefícios para os EUA de uma eventual iniciativa golpista na maior potência latina, eu juro que não. Sem nenhuma preocupação ideológica com Lula e longe de querer se envolver diretamente na inelegibilidade de Jair, o que Trump mais teme é a influência chinesa na região e crescente parceria comercial entre Brasil e China. Isso sim deve ampliar as tensões com os Estados Unidos. O resto é devaneio patriótico de sonhadores notívagos. Nada que atabaques bem tocados em uma boa curimba rhythm and blues não resolva.

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*Wenceslau Araújo é Editor-Chefe de Notibras

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