Derrota programada
TSE, o tribunal que criou urna e enterrou suspeita de fraude
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emRepresentando uma das inovações da Revolução de 1930, a Justiça Eleitoral foi criada em 24 de fevereiro de 1932, mesma data da promulgação do Código Eleitoral, inspirado no similar checoslovaco e nas ideias do politico, fazendeiro e embaixador Joaquim Francisco de Assis Brasil. Atualmente, a existência e regulamentação da Justiça Eleitoral do Brasil está determinada nos artigos 118 a 121 da Constituição de 1988. Entre as principais funções, compete ao Tribunal Superior Eleitoral e aos 27 Tribunais Regionais Eleitorais regulamentar, administrar, executar e fiscalizar todo o processo, além de julgar todo contencioso eleitoral. Embora pareça desnecessário, esse preâmbulo se faz necessário para ilustrar que, com muito orgulho, fiz parte da história do TSE por longo e inesquecível período. Repórter político nas eleições de Fernando Collor e de Fernando Henrique Cardoso, também fui assessor direto de cinco presidentes da Corte.
Por conta do trabalho em outros tribunais e da aposentadoria a que me permiti, não usufrui das instalações palacianas do edifício de nove andares que hoje serve de sede para o TSE, a sexta da história da Corte. Exageros à parte, a necessidade do “predião” é explicada pelo aumento da demanda, consequentemente de servidores. Tudo bem. Prefiro lembrar do “cercadinho” que abrigou o ex-sisudo tribunal por quase 40 anos e onde atuei por mais de dez anos como repórter e assessor. Aliás, no próximo dia 15 de dezembro a nova sede completa uma década. Ela foi inaugurada exatamente na data em que o arquiteto que a projetou, Oscar Ribeiro de Almeida Niemeyer Soares Filho, completou 104 anos.
O protocolo de intenções com as linhas gerais do prédio foi assinado em abril de 2005, na gestão do ministro Carlos Velloso, no meu tempo de secretário de Comunicação. Fui ao Rio com o diretor-geral da Corte, o amigo Athayde Fontoura Filho, registrar a assinatura do contrato. Só o projeto custou R$ 6 milhões. De tão pequeno, o antigo prédio parecia “flutuar” na quadra conhecida como Praça dos Tribunais. Pequeno, mas, pelo menos naquela época, suficiente para acomodar servidores, terceirizados e mais sete magistrados responsáveis por um ou mais destinos. Os sete ministros (três cedidos pelo STF, dois pelo STJ e outros dois indicados pela OAB) se reuniam e continuam se reunindo nas noites de terças e quintas-feiras. Tudo bem que a Corte precisava crescer, até para agregar os antigos anexos e o crescente volume de processos.
Lembro bem que, nos eventos solenes, o auditório ficava lotado e, em muitos casos, as cerimônias tinham de ser realizadas na área externa, como foram as festas de diplomação de Fernando Collor, Fernando Henrique Cardoso e de Luiz Inácio Lula da Silva. Era diferente até pela participação do povo. Também não devemos esquecer que, conforme dados do IBGE, em 1971, por exemplo. havia 29.446.023 brasileiros inscritos no cadastro eleitoral. Hoje, são mais de 150 milhões de eleitores. Embora a história seja longa e muito interessante, vale a pena um pulo no tempo para chegarmos a 1996, primeiro pleito com urna eletrônica. A eleição municipal daquele ano foi “aprontada” por Carlos Velloso, mas foi São Marco Aurélio, o ministro das decisões rápidas, quem a executou e enfrentou os maiores perrengues para que não houvesse qualquer dúvida a respeito da segurança e inviolabilidade do equipamento.
Graças ao empenho e a coragem de Marco Aurélio, os votos de mais de 32 milhões de brasileiros, um terço do eleitorado da época, foram coletados e totalizados por meio das mais de 70 mil urnas eletrônicas produzidas para aquelas eleições. E não houve nenhuma das fraudes que o grupo do governo do faz de conta vem tentando imputar às máquinas. Vale reiterar que o ministro Marco Aurélio não foi apenas o presidente que primeiro usou as maquininhas de votar. Ele chamou para si a responsabilidade e apostou todas as fichas no sucesso e consolidação do sistema eletrônico, a ponto de “romper” com alguns presidentes de tribunais regionais que não acreditavam e ameaçavam não usá-lo. A resposta do ministro foi definitiva: “Se vocês não querem fazer, o TSE faz”. E fez.
As urnas foram utilizadas em 57 cidades com mais de 200 mil eleitores, entre elas 26 capitais (o Distrito Federal não participou por não eleger prefeito). Hoje, 25 anos após a saga dos ministros Carlos Velloso e Marco Aurélio, o Brasil dispõe de um dos mais modernos sistemas de votação já implantados, com mecanismos eletrônicos de coleta e aferição de votos que são, a um só tempo, rápidos e confiáveis. Devido a essa tecnologia, o país é um dos poucos a anunciar resultados de eleições poucas horas após o encerramento da votação. Após ameaças diversas, também temos de incluir na lista de corajosos da Justiça Eleitoral o atual presidente da Corte, ministro Luiz Roberto Barroso. No meio da confusão, sem medo de errar, ele garantiu eleições para 2022. E mais, com urnas eletrônicas, sem auditagem e sem a farsa de fraudes. Enfim, o voto impresso finalmente é um “defunto enterrado”.