Bartô Granja, Edição
A União Europeia enfrenta crescente pressão para se manifestar contra a erosão da liberdade de imprensa na Turquia depois que o governo do presidente Recep Tayyip Erdogan assumiu o controle do jornal de maior circulação no país. Mas poucos esperam os europeus adotem uma ousada abordagem, já que precisam da ajuda dos turcos para lidar com a crise de refugiados.
Pelo segundo dia consecutivo neste sábado os policiais usaram gás lacrimogênio para dispersas centenas de manifestantes que se reuniram do lado de fora da sede do jornal Zaman, agora cercado pela polícia. O prédio foi invadido na sexta-feira, em cumprimento à ordem de apreensão judicial da publicação, que está ligada ao principal rival do presidente Erdogan, o clérigo da oposição Fethullah Gulen.
Tropas de choque usaram escudos e gás lacrimogêneo para conter a multidão aos gritos de “Imprensa livre não pode ser silenciada” e “Zaman não pode ser silenciado”. Alguns foram vistos esfregando o rosto com pedaços de limão para mitigar os efeitos do gás, informou a agência de notícias Dogan. Vários manifestantes ficaram feridos.
O tribunal de Istambul nomeou curadores para administrar o Zaman e suas outras publicações, reduzindo o número de órgãos de imprensa de oposição na Turquia, hoej dominada por mídia pró-governo. A medida levanta preocupações sobre uma deterioração dos direitos no país membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), que também deseja aderir à UE, antes de reunião marcada para 7 de março, na qual líderes europeus tentarão convencer a Turquia a agir mais para conter o fluxo de refugiados viajando à Europa.
“Os países europeus estão preocupados com a crise de imigração, eles não mais estão preocupados com a violação de direitos na Turquia”, afirmou Semih Idiz, colunista dos jornais Cumhuriyet e Daily Hurriyet. “Eles dirão algumas coisas apenas para constar, mas eles sabem que são dependentes da Turquia”, completou.
A edição deste sábado da versão em inglês do Zaman, publicada antes de o governo assumir o controle do prédio, trouxe a primeira página toda em preto com a manchete: “Dia vergonhoso para a imprensa livre na Turquia”. A invasão da sede do jornal pela polícia é parte de uma repressão ao movimento Gulen, que Erdogan alega tentar derrubá-lo.
Autoridades acusam os seguidores do movimento de se infiltrarem na polícia e no judiciário, além de orquestrarem acusações de corrupção em 2013 e implicarem o círculo mais íntimo de Erdogan, em uma tentativa de desmantelar o governo.
Gulen, que se autoexilou nos Estados Unidos desde 1999, já foi aliado do atual presidente turco. Nos últimos anos, contudo, o governo expurgou milhares de funcionários públicos supostamente ligados ao movimento e apreendeu negócios afiliados. O movimento também foi rotulado como organização terrorista, ainda que não tenha executado qualquer atentado.
O primeiro-ministro turco, Ahmet Davutoglu, insistiu em visita ao Irã que a indicação de administradores para a publicação foi uma decisão legal, e não política. Ele também negou o envolvimento do governo na tomada do jornal. “Nós não interferimos…e nem o faremos”, afirmou ele.