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O ogro

Um dia como qualquer um numa agência do BB

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Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Produção Irene Araújo

Um dos meus sobrinhos tomou posse em uma agência do Banco do Brasil, em Brasília, há poucos meses. Por conta disso, ele e eu passamos a falar sobre como era trabalhar no principal banco do país. É que o meu sobrinho não é o primeiro da família a ser funcionário de lá, pois, até onde tenho conhecimento, fui o primeiro.

Não sei exatamente em que ano aconteceu, mas foi lá pelo início dos anos 1990 na antiga agência do Banco do Brasil localizada na esquina da rua Figueiredo Magalhães com a avenida Nossa Senhora de Copacabana, no Rio de Janeiro. Nessa época, a inflação era galopante e, por isso, o banco vivia lotado, especialmente nos dias 5 e 10, quando eram as datas de vencimentos de contas como, por exemplo, luz e água.

Apesar trabalhar numa agência, o meu atendimento com o público acontecia através de telefonemas, pois eu mexia com devolução de cheques. E o meu setor ficava na parte superior da agência, em uma sala onde apenas outros funcionários tinham acesso. Era um serviço legal, pois eu entrava às 8 e saía às 14h, o que me dava o resto do dia para ir ao cinema, à praia ou mesmo ficar de bobeira.

Uma outra coisa que você precisa saber é que, naquele tempo, as agências não possuíam aquelas portas giratórias, o que tornava o entra e sai muito mais ligeiro. Por conta disso, o local, de uma hora para outra, ficava apinhado de clientes, o que tornava o ambiente completamente caótico.

Pois bem, lá por volta das 12h, quando o meu serviço já estava praticamente finalizado, eis que a gerente do atendimento da parte inferior entrou desesperadamente na minha sala.

— Dudu, você precisa me salvar!

— O que houve, Nágila?

— A agência tá parecendo a quadra da Mangueira no último dia de ensaio.

A minha colega me pediu para ficar na porta da agência a fim de controlar o acesso dos clientes. Dessa forma, lá fui eu enfrentar aquela multidão. Não sei como, mas consegui fazer com que o público formasse uma fila na calçada. Certamente não foi por causa do meu físico de levantador de palito, mas creio que o crachá de funcionário do Banco do Brasil pendurado no pescoço ajudou.

A orientação que eu havia recebido era de deixar um cliente entrar na agência quando outro saísse. E tudo corria bem, até que um cara enorme, desses que parecem sair dessas revistas de halterofilistas, parou diante de mim. Para você ter ideia do tamanho do sujeito, precisei levantar um pouco a cabeça para ver o seu rosto, e olha que eu me encontrava no piso da agência, que ficava a aproximadamente 20 centímetro acima da calçada.

— Preciso entrar.

— Senhor, toda essa gente na fila também precisa.

— Mas a minha mulher tá aí dentro.

— Ah, tá. Minuto.

No entanto, antes que eu pudesse pedir para alguém procurar pela esposa do cara, eis que ela apareceu e, educadamente, me indagou.

— Você pode deixar o meu marido entrar?

— Claro que sim.

Nisso, o grandalhão, antes de entrar na agência, me deu um esbarrão no ombro e soltou essa:

— Babaca!

Como não sou de briga, ainda mais diante de tamanha disparidade de categorias, pois estou mais para peso palha, minha atenção ligeiramente retornou para a fila, que já dobrava a esquina. Naquela hora, eu só desejava que desse a minha hora de ir embora para casa, trocar de roupa e correr para a praia.

E lá estava eu, escriturário do Banco do Brasil, mas exercendo a função semelhante a de porteiro de boate na Lapa, quando o troglodita e a esposa saíram da agência. O problema é que o cara, já na calçada, apontou o dedo na minha cara e profetizou:

— Vou te pulverizar, moleque!

As pessoas mais próximas, inclusive o Alcir, um dos seguranças da agência, olharam aquela situação. E eu lá, em pé diante daquela massa furiosa de músculos, prestes a virar poeira. Mas eis que, não sei se por medo ou confiante no meu crachá de funcionário do Banco do Brasil, que continuava pendurado no meu pescoço, respondi:

— Tá bom, senhor. Mas pode ser depois das 14 horas? É que agora estou no meu horário de trabalho.

Todos ao redor começaram a rir e, para a minha sorte, até a esposa do cara parece que ficou ao meu lado.

— Maurício, deixa de ser ridículo! O garoto está trabalhando!

E lá foi aquele ogro, que certamente iria me pulverizar, puxado pelo braço pela amada. E a galera da fila, obviamente, não deixou barato, pois surgiu uma saraivada de gritos:

— Otário!

— Imbecil!

— Ridículo!

— Ei, Maurício! Cuidado pra não apanhar em casa!

O meu sobrinho, provavelmente, nunca vivenciará momentos tão tensos na sua carreira no Banco do Brasil. É que Copacabana é outro nível. E eu amo aquele lugar!

*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.

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