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Tempos de negritude

Um vai e outro fica sem a doce loucura da liberdade

Publicado

Autor/Imagem:
Eduardo Martínez - Foto Produção Irene Araújo

Deitados tão próximos, aqueles dois sussurravam para que os tantos outros não os pudessem ouvir. E, caso alguém os escutasse, poderiam ser denunciados. Boa paga não lhes faltaria.

— Vamos?

— Tá louco?

— Loucura é ficar aqui.

— Deixa de ser ingrato, homem.

— Ingrato?

— Sim.

— Tá louco?

— Loucura é o que você quer fazer.

— Não fico nem mais um dia aqui.

— Não pensa no senhor Augusto?

— Tá louco?

— Louco é você de não reconhecer a bondade do homem.

— Tá louco?

— Louco é você.

— Já esqueceu daquilo?

— Mereci.

— Tá louco?

— Fiz corpo mole. Mereci.

— Tá mesmo louco.

— Não vá, por favor. Pense no senhor Augusto.

— Tá louco?

— O homem vai ter um baita prejuízo.

Deu de ombros para as súplicas do companheiro e se embrenhou pela mata adentro. Nunca mais se ouviu falar dele. Não se sabe se onça comeu ou se continua por aí, livre. Tronco, nunca mais.

A verdade é que o amigo que ficou, mãos calejadas, costas marcadas por conta de corpo mole, fez tudo para compensar a perda do senhor Augusto, proprietário de engenho lá para os lados de Palmares. O ano era 1624.

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