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Vaidade cria conflitos políticos, jurídicos e ideológicos no Brasil

O desgastante vai e vem e o exagerado timing do Poder Judiciário para julgar questões demasiadamente conflituosas são capazes de suscitar dúvidas quanto ao desfecho de determinados processos. Beltranos e ciclanos que tentaram mudar o rumo da prosa democrática, inclusive com ameaças a vida de fulanos, serão mesmos condenados? O que falta para isso? Os indícios e as presunções são irrelevantes diante da relevância das provas? Enquanto isso não é dito de forma clara, objetiva e sem senões, há que se considerar que exageros não significam má conduta e que excessos de vaidade existem em qualquer segmento profissional, inclusive e sobretudo no meio jurídico.

Chegamos ao atual nível de conflito político, social, ideológico e jurídico exatamente pela vaidade excessiva de um desses segmentos. Não fossem a sanha, a volúpia, a ânsia e o desejo de poder a todo custo de um grupo enjaulado e louco pelo Planalto, certamente estaríamos vivendo uma quadra diferente, com menos contencioso, mais paciência e, quem sabe, muito mais expectativas positivas. Se os perdedores tivessem esperado 2026, a política brasileira estaria pacificada e provavelmente longe das páginas policiais. Infelizmente, a realidade que nos é apresentada é outra. O passado recente do radicalismo todos conhecem. O presente ainda não aconteceu de fato e o futuro é uma incógnita.

Apesar dos atrasos e de eventuais dúvidas acerca da isenção no andamento do processo, o que não se deve ignorar, tampouco duvidar, é que os 40 indiciamentos e a prisão de generais estrelados seguiram todos os ditames da lei. Por consequência, não houve ilegalidade alguma. Na outra ponta, embora tabajara, a tentativa de golpe não foi uma brincadeira de meninos recém-chegados da Disney. Além de verdadeiro, o motim só não se consolidou por razões alheias à vontade de seus mentores. Diante das evidências irrefutáveis, o ex-vice-presidente e atual senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS) também se viu obrigado a reconhecer publicamente o plano golpista. Até bem pouco tempo ele admitia as reuniões, mas não a ação.

Bom reconhecer, mas desnecessário e inoportuno minimizar o frustrado planejamento, afirmando que a rebelião militar era “um troço sem pé nem cabeça”. Pode ser, mas tinha cabeça pensante, tronco e membros. Aliás, muitos membros e todos dispostos a matar para se ocuparem de um posto para o qual não foram eleitos. Ou seja, o general senador passou recibo e confirmou o que a Polícia Federal e o ministro Alexandre de Moraes investigam profundamente há dois anos. Não sei se combinado, mas simultaneamente a Frente Parlamentar da Agropecuária (FAP), entidade que reúne 340 deputados federais e senadores, também fez sua mea culpa. Para alguns ruralistas, esses dois gestos não querem dizer nada. Como nada? Dizem muita coisa.

O óbvio é que, depois da prisão do general Braga Netto, parece que o medo do ferrão oculto do marimbondo de fogo despertou nos menos radicais a necessidade de tirar o deles da reta. Isso ficou claro após a suspeita de que o “pessoal do agronegócio” teria financiado o levante. Rapidamente as excelências da FAP passaram a defender uma investigação conduzida com urgência e rigor a respeito da denúncia feita pelo tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro. Segundo eles, ações isoladas não podem comprometer a imagem do setor. Isoladas ou coletivas, as ações ora combatidas não são uma invenção da PF ou de Alexandre de Moraes, diz.

A exemplo dos demais poderes, o Judiciário tem suas mazelas. Simbólica, a principal delas é que não há meio termo na avaliação dos que o procuram: 50% amam e 50% odeiam. A metade para lá e para cá é representada pelos vencedores e pelos perdedores das demandas. Portanto, o Judiciário e parte de seus integrantes podem ter errado. Errar não é crime. Erraram e talvez continuem errando porque são homens e não anjos. Erram, mas não subestimam as leis e não atentam contra a ordem. Se um dia fizerem isso, terão de ser punidos com o mesmo rigor que buscam aplicar aos que tentaram tomar na marra uma eleição que não souberam ganhar. Simples assim.

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*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978

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