O manual do bom jornalismo determina que nenhum texto ou narrativas sejam iniciados pelo vocábulo não, substantivo que sintetiza a negativa enfática e, de acordo com o dicionário, contestação ou o contrário do que se afirma. Por isso, vamos começar positivamente. Ontem (29) pela manhã, durante o baculejo no quarto e sala da família Bolsonaro na periférica Angra dos Reis, os brutos Jair e Carlos Bolsonaro esqueceram dos momentos de brutice contra a Polícia Federal. Contidos e acuados, não se intrometeram no trabalho dos briosos homens da lei, os mesmos que até bem pouco tempo agiam sob o comando do clã. É claro que não os que estiveram na humilde “residença” do ex-presidente.
Portanto, há que se louvar o comportamento de ambos. Da mesma forma, temos de enaltecer o pedido vespertino de Jair ao presidente do PL, Valdemar Costa Neto. Aí de forma bruta e com palavrões peculiares às casas de lenocínio, Bolsonaro “exigiu” de Vavá uma reação dura sobre a operação da PF, consequentemente contra o ministro Alexandre de Moraes, relator do processo que apura a transformação da Abin em um SNI Tabajara. Embora alguns avaliem o pedido como algo negativo para a República, eu, do alto de minha insignificância jurídica, suspirei aliviado. E sugiro aos amigos que não apoquentem. Saibam todos que o pedido é positivo até a medula de Valdemar.
E a razão são das mais variadas e atemporais. O passado de mensaleiro do presidente do PL o condena. O presente de “passador de pano” nas teses contrárias aos ministros do STF, conforme o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), é comprometedor. Quanto ao futuro de quem, também segundo Pacheco, faz da política um exercício único para ampliar e obter ganhos com o Fundo Eleitoral, eu diria que é assustador, na medida em que a possibilidade de voltar a ser alvo é do tamanho das baboseiras que é obrigado a “declamar” para agradar a família que o mantém líder partidário.
Com medo da própria sombra, principalmente da sombra da ex-mulher, se pudesse Valdemar Costa Neto enfiaria a cabeça sob o rabo (ou dentro) de um jumento e partiria a nado para bem longe do Brasil. Enquanto está por aqui, prefere agir como o pobre do sertanejo procurado por uma ruma de evangélicos e indagado se queria ser testemunha de Jeová. “Não, pessoal, eu nem vi a briga”. Esta é a resposta que Vavá gostaria de dar a Jajá. Não pode por razões obvias e porque sabe que Xandão e a PF preparam uma nova rodada de operações contra o bolsonarismo. No útero de sua pródiga imaginação, ele tem consciência de que corre sérios riscos caso tenha de responder todos os dias ao temor dos covardes golpistas.
Escolado na malandragem política, diplomado nas sentenças dos togados e pós-graduado no recolhimento de presidiário, Vavá, mais uma vez, deverá recorrer aos argumentos pendulares, aqueles do tipo meio barro e meio tijolo que não ofendem os inteligentes, mas agradam os estultos. Em outras palavras, entre o querer de Jair Bolsonaro e o poder de Valdemar Costa Neto vai uma enorme distância. Afinal, antes de ser a mesma coisa, uma coisa é uma coisa e outra coisa é uma coisa diferente. Entenderam? Eu também não, mas a ideia é afirmar que, ainda que diga muita coisa de forma enérgica, Vavá dirá coisa alguma. Pelo menos do ponto de vista da coisa toda.
Valdemar está ciente de que quem deve, teme. Nesse momento de pavor no terreiro bolsonarista, o melhor a fazer é o recolhimento no sofá da sala, jantando canja de galinha com torradas sem manteiga. Também é recomendável a leitura do Kama Sutra e muitas orações, meditações, sal grosso e ebós em homenagem a Adonai, Krishna, Brahman, Belzebu, Vishnu, Buda, Olorum, Zambi, Mawu e Caboclo Ventania. Meu cardo Valdemar, ouça o clamor das ruas e reconheça a força do cajado de Pai Xandão. Se cuida, mizifio. Não tema a brutice do moço. Muita coisa vai rolar até o carnaval chegar. Se não quiser ser arrolado, faça o discurso exigido por Bolsonaro na linguagem de Libras. Mas não esqueça de esquecer o tradutor.
*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978