A reunião com os embaixadores estrangeiros não foi a primeira e, certamente, não será a última vergonha protagonizada pelo presidente da República Federativa do Brasil, cuja tática trumpista contra a urna eletrônica não assusta mais nem os meninos do maternal I. As conspirações e afirmações infundadas a respeito da segurança do sistema eleitoral brasileiro só ajudam a confirmar o nível de desespero que tomou conta da campanha bolsonarista. Impressionante é a forma como o mandatário e sua trupe continuam agindo. Passam a impressão que todos ainda acreditam na farsa que é o governo do mito. Sabem de nada, inocentes. Esquecem, por exemplo, que, pela terceira, quinta, décima, enésima vez, as urnas eletrônicas que serão usadas em outubro foram validadas.
Anunciada em meados deste mês, a última validação foi do Tribunal de Contas da União. De acordo com relatório do TCU, o Tribunal Superior Eleitoral tem planos capazes de prevenir, detectar, obstruir e neutralizar qualquer ação que ameace a segurança dos votos. Antes disso, o tribunal havia analisado e aprovado a confiabilidade, aspectos materiais e a proteção do processo eleitoral. O TCU não foi o único organismo a verificar a segurança das máquinas. Por diversas vezes, hackers e instituições sérias e capazes comprovaram a impossibilidade de fraudes. Em reuniões públicas, ficou claro que os equipamentos dispõem de mecanismos de fiscalização que permitem análise em todas as rodadas de votação.
Isso quer dizer que acabou a falsa novela protagonizada pelo líder da enlameada república e por seus apoiadores contra a Justiça Eleitoral? Infelizmente, não. O enredo é antigo e ainda hoje a única forma clássica de justificar a eventual derrota nas urnas. Desde que foi eleito, Jair Messias Bolsonaro tenta desacreditar o processo. Sem jamais ter apresentado provas, já chegou a afirmar que as eleições de 2018 foram fraudadas, pois, segundo ele, teria vencido a corrida presidencial no primeiro turno. É claro que a divindade do cerrado nunca assumirá que não tinha voto para isso, assim como não terá para um segundo mandato. Eis a razão do discurso raivoso para agradar seus fanáticos e pueris (acriançados) seguidores.
Embora não veja chance de derrota para Luiz Inácio – para ele é o mesmo que o Flamengo enfrentando o Bangu –, Bolsonaro treme ao ouvir falar de Lula. Pior é ele ter certeza de que a maioria dos votos conquistados em 2018 por conta do antipetismo está voltando ao berço. Daí a necessidade do velho discurso da fraude. No circo sem lona armado para receber os embaixadores, havia apenas um palco no qual o mito era o mestre de cerimônias, o engolidor de facas e o moço de fraque colorido que contava piadas batidas e sem graça. Obviamente, mais uma vez o mote foram as urnas eletrônicas. Como embaixador não vota, apenas sua excelência não se tocou de que a melhor anedota foi o país inteiro ter percebido que o alvo a ser atingido com as lorotas era seu cada vez menor eleitorado.
A verdade é que o blá blá blá não convence mais ninguém. Acho que até os guris matriculados por Donald Trump na última turma de formação de reacionários já se convenceram da segurança das maquininhas brasileiras de votar. Seria realmente coisa de criança apostar na resenha de fraude não fosse o ódio destilado sobre tudo e todos que confiam pouco ou plenamente nas urnas eletrônicas. O que causa espécie é o fato de um dos criadores da urna não se manifestar publicamente sobre o equipamento que criou. Nos bastidores, ele jura que a máquina é segura. Então, por que te calas? Esqueça a idolatria e fale a verdade. O Brasil espera isso de ti. Enquanto tu padeces com o silêncio forçado, a iminente derrota do teu líder não deixa dúvida alguma a respeito da proposta de golpe. É isso que tu queres?
Ficará na proposta, pois tudo indica que, a exemplo dos EUA, onde Trump, mestre do mito, esperneou, mas teve de entregar a rapadura, Jair Messias terá de se acostumar com o ostracismo. Não desejo mal ao semelhante, mas oxalá não ocorra coisa muito pior. Ou seja, nada além do jus sperniand, cuja tradução é inconformismo contra decisão judicial. E não há razão para ser diferente. Com que base Bolsonaro fala em golpe? Quem lhe dará suporte? Não há poderes absolutos. Acredito que nem as Forças Armadas o apoiam contra a Constituição. Pelo sim, pelo não, é o caso de o Brasil que não quer mais Bolsonaro estar preparado para garantir a posse de quem vencer a eleição presidencial deste ano. E não basta o compromisso do presidente do Senado com a democracia.
É preciso muito mais do que força, foco e fé. Talvez um sorriso desafiador contra aquele que se faz de desentendido quando alguém lhe diz que a diferença entre ganhar e perder está nos detalhes. No caso do moço em questão, o detalhe é simples: a gente não pode perder o que nunca teve, manter o que não é nosso, tampouco agarrar algo que não quer não ficar sob nosso comando. Sabe aquela vontade de transformar o sonho em realidade? A diferença entre o possível e o impossível é a força de vontade. Portanto, que o medo de falhar nunca supere a vontade de conseguir a liberdade política. As falhas ocorreram, mas o valor do voto ainda é o principal sinônimo de democracia consolidada. E esta depende do estado de espírito da maioria. É fundamental não desistir depois de um fracasso. Espero que entendam o que quero dizer. O Brasil não precisa de negacionistas, muito menos os eleitorais.