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Vantagem de ‘estar no sal’ é que não estraga nunca

Zezinho, garoto de seus quase sete anos, de tão irrequieto, não conseguia ficar nem mesmo um dia sem aprontar. Tamanha hiperatividade, as boas e as más línguas diziam, era consequência da falta de umas chineladas. Outros falavam em cinto e até na aposentada palmatória.

Os pais, contrários a tais métodos reprováveis, procuravam conversar com o filho. O problema é que o danado tinha um sorriso tão cativante, ainda mais porque estava naquela fase banguela dos dois dentes da frente, que só conseguia arrancar abraços e beijos dos genitores.

Ah, é preciso dizer que o Zezinho não era malvado, mas, digamos, um tanto desastrado por conta da quase infinita energia em filhotes de gente. Dessa forma, aquele corre daqui, corre dali, ainda mais quando estava dentro do apartamento da família, se tornava momento de tensão. Não à toa, pois o pequeno já ostentava algumas marcas pelo corpo.

Alguns pontos nos joelhos, outros tantos nos pés. Na testa, então, era um festival de ziguezagues provocados pelos fios utilizados pelo médico para costurar a pele do guri. Mas não pense você que o Zezinho adorava ir ao hospital para ser remendado, pois não gostava e ainda abria aquele berreiro.

E foi justamente na manhã seguinte a uma das inúmeras idas do Zezinho ao hospital, dessa vez para colocar gesso no pé direito, que algo aconteceu. A mãe, que havia conseguido alguns dias de folga no trabalho para ficar com a cria, foi até a cozinha preparar um lanche para o filho.

Zezinho, querendo brincar de algo, percebeu que a bola estava bem no fundo do cesto de brinquedos. Tira carrinho, tira pazinha e baldinho, tira dominó, tira jogo de memória… Finalmente, o garoto conseguiu alcançar a bola. Até aí, tudo bem. O desastre foi o que veio logo em seguida.

Sentado na cama, com a bola posicionada em frente ao pé esquerdo, Zezinho olhava para a entrada do quarto, imaginando-a como baliza. O menino calculou para marcar aquele gol e, então, meteu a bicuda. O problema é que a bola acertou a bandeja que a mãe carregava. E lá foram o suco de melancia e o misto-quente pro piso.

A mulher ficou furiosa e, pela primeira vez, perdeu a paciência com o filho.

— Você tá no sal, moleque!

— Que bom, mamãe!

— Bom? Por quê?

— Ué, se estou no sal, não vou estragar.

*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.

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