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Vida efêmera de mariposa acaba pisada por homem solitário

A crisálida agigantou-se, a pupa acetinada tinha pequenos impulsos pulsantes e sensuais. No início da noite ela se arrebentou e surgiu uma mulher. Ainda com antenas felpudas e asas robustas de mariposa. Que pouco a pouco, jogada na terra úmida foram se dissolvendo.

A mulher estava trêmula e seu corpo nu todo molhado. Estremecia em posição fetal.

Um homem solitário que passava no momento apiedou-se da frágil criatura, envolveu-a em sua jaqueta e procurou o lugar mais próximo para abrigá-la.

Entrou na Casa das Meninas, um prostíbulo famoso da redondeza e foi recebido por Dona Gio, a proprietária do lugar, que prontamente levou a mulher para um quarto para enxugá-la e aquecê-la.

Pensava que estivesse morrendo de alguma enfermidade. Mas ao acender a luz do cômodo viu que a mulher avivou-se e a pele embranquecida foi ruborizando aos poucos.

Olhou com cuidado o corpo nu na cama e já imaginou o quanto ganharia com aquela mercadoria.

A mulher apenas falou o seu nome sentindo certa rouquidão na voz que custava a sair.

– Meu nome? Ercilia, mas pode me chamar do que a senhora quiser – e emudeceu, não tinha muito o que falar. Aninhou-se envolta dos cabelos negros e muito longos e adormeceu.

A Casa das Meninas ficava na penumbra até durante o dia quando o sol queimava lá fora e parecia bem acolhedor.

Ercilia ganhou uma camisola negra e uma presilha dourada para os cabelos.

Sentiu logo que ali era um bom lugar para acasalar. Alimentar-se não era o seu forte, preferia verduras e frutas, lembrança da vida rastejante de lagarta e tinha uma necessidade muito grande de sugar. Já no primeiro cliente que atendeu na segunda noite que passara ali, quase tirou sangue do seu pescoço. Orientada por Dona Gio, não deveria assustar os clientes e sim realizar seus desejos.

Deitava com quantos homens fossem para terminar a madrugada junto à janela, fumando um cigarro e olhando a lua, seu desejo primordial.

Diferente de baratas que perseguiam lugares escuros e sombrios, Ercilia era atraída pela luz. Gostava de se mostrar. O holofote que iluminava o pequeno palco onde um saxofonista entoava suas músicas, era seu lugar preferido, onde dançava de forma frenética e sensual.

Sua beleza exótica atrai mais cliente mesmo ela tendo preferência por um fazendeiro velho, muito bem vestido que adornava o peito com um colar de ouro com uma medalha reluzente da imagem de São Jorge. Ele a chamava de bruxa. Ela sugava seu pescoço, seu rosto, os dedos e o falo. Dona Gio estava radiante.

Numa noite de lua cheia houve um apagão na cidade. Tudo no escuro apavorou Ercília que olhava para a lua com um desejo perene. E dos seus cabelos longos e negros formaram-se asas felpudas e robustas e do alto da sua cabeça nasceram antenas endentadas. E ela saiu voando pela janela ao encontro da lua. Mas como estava longe demais e já havia pequenas ranhuras em suas asas despencou do alto de uma árvore onde posou para admirar seu desejo. Vida efêmera de mariposa. E terminou no chão frio da terra sendo pisada por um homem solitário que passava no momento.

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