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Voracidade dos aliados de Temer ameaça enterrar tese do impeachment

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Cláudio Gonçalves Couto

Devem estar desapontados muitos dos cidadãos que foram às ruas de verde e amarelo, desde o início de 2015, clamando pelo afastamento de Dilma Rousseff –e, consequentemente, do PT– do governo federal.

A decepção deve ser sentida ao menos por aqueles que se mobilizaram ativados, mesmo que brevemente, pela crença de ser o partido de Lula o principal responsável pelos descalabros da corrupção que se abatem sobre nosso país. Afinal, a sucessão de problemas envolvendo membros do atual partido presidencial –bem como de muitos de seus aliados na nem tão nova coalizão governista– demonstra que os problemas de corrupção do Estado brasileiro vão muito além dos erros cometidos pelo PT.

Os governos petistas, assim como os que lhes antecederam, tiveram que governar mediante a montagem de amplas coalizões congressuais. Essa é a essência de nosso sistema de governo, que é conhecido pela agora vulgarizada, mas nem por isso errada, expressão “presidencialismo de coalizão”.

Contudo, há diferenças quantitativas e qualitativas entre os Congressos Nacionais com que tiveram de lidar os presidentes que nos governaram desde 1988. Quantitativamente, a principal diferença diz respeito ao número efetivo de partidos com assento nas duas casas do Congresso e, consequentemente, com o número de partidos necessários para montar uma coalizão majoritária.

Enquanto que Fernando Henrique Cardoso conseguia montar tal base parlamentar com algo entre 3 e 5 partidos na Câmara dos Deputados, Lula passou a operar com um número entre 5 e 7, ao passo que Dilma precisou de ainda mais. Ou seja, para atingir os mesmos patamares de apoio legislativo, cada novo presidente precisava contar com um número maior de aliados, coordenando-lhes e, claro, recompensando-lhes pelo apoio emprestado. A proliferação de ministérios foi o reflexo mais visível dessa necessidade de se recompensar um número cada vez maior de parceiros para poder obter proporções similares de sustentação legislativa.

Qualitativamente, a diferença concerne a duas dimensões: uma coletiva e outra das individualidades agregadas, sendo que esta diz respeito ao perfil dos parlamentares. Cada vez mais, os políticos formadores de opinião e os formuladores de políticas públicas cedem espaço aos versados na arrecadação de fundos de campanha, seja para si mesmos, seja para outros, ou da forma que for. A eles se agregaram as celebridades e subcelebridades dos mundos midiático e religioso –frequentemente, sendo de ambos.

O antes chamado “alto clero” parlamentar foi, paulatinamente, substituído por um “lumpemparlamentariado”, para o qual até mesmo o termo “baixo clero” elucida pouco. Afinal, não se trata apenas do predomínio numérico de parlamentares de menor envergadura intelectual, política ou moral, mas sim da ocupação feita por eles de postos-chave nas estruturas legislativa e partidária. Acima deles despontam os que, mesmo sem maiores preocupações republicanas ou sem uma visão de país, são mais desenvoltos para liderar a arraia miúda e manejar estruturas institucionais.

A dimensão coletiva da mudança qualitativa diz respeito ao crescimento das bancadas dos partidos de adesão, aqueles tão atavicamente governistas que são incapazes de atuar na oposição –senão para barganhar maiores recompensas. É essa incapacidade que lhes dificulta articular candidaturas presidenciais próprias e competitivas, já que não logram convencer o eleitorado de que são portadores de algum tipo de projeto minimamente compreensível e dotado de sentido.

Nesse campo, o PMDB se destaca por ser, ao mesmo tempo, o partido maior, mais capilarizado e mais dotado de lideranças com capacidade de operar institucionalmente. Por esses atributos, funciona como um polo gravitacional do sistema, em torno do qual orbitam os demais partidos de adesão.

Eis que, por razões já conhecidas, tal partido conquista a Presidência da República, guindando ao cargo um homem que, por anos, demonstrou habilidade para liderar essa geleia invertebrada e voraz. Inegavelmente, um homem do sistema.

Porém, uma coisa é liderá-la em sua voracidade, outra –bem diferente– é satisfazer a ela e a seus satélites, que funcionam pela mesma lógica. A tarefa não só é difícil, como apresenta forte risco de autofagia, e com perspectivas ainda mais sombrias quando as poucas lideranças com capacidade de articular institucionalmente se veem acossadas por investigações de corrupção. O sistema dá sinais de fadiga.

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