A avalanche de dúvidas e de perguntas sem respostas a respeito do processo relativo à tentativa de golpe contra a diplomação, posse e contra a vida do presidente eleito Luiz Inácio tem atarantado juristas, especialistas e até ministros do Supremo Tribunal Federal. Imaginem os leigos e os poucos entendidos que, como eu, viajam na maionese e, no máximo, entendem que a mistura de nitroglicerina com pólvora pode gerar estragos imensuráveis na República. Me valendo de algum conhecimento alcançado a partir do convívio diário com mestres do STF de outrora, não questiono a tipificação do golpe como crime. Conforme a literatura jurídica, tentativa ou planejamento já configuram ilicitude. Portanto, não há que duvidar.
O que questiono é a condução do processo às escondidas e o volume de indagações nas gavetas dos delegados da Polícia Federal, do procurador-geral, Paulo Gonet, e do ministro Alexandre de Moraes, o dono do campo, da bola, das camisas e técnico informal da equipe. Lá se vão dois anos e nada. Será que estão esperando o carnaval eleitoral chegar para prender gregos e baianos? Caso isso ocorra, como negar aos seguidores de um dos personagens centrais da história que não houve oba oba para beneficiar o adversário de ontem, de hoje e de sempre? Convenhamos que não será tarefa das mais fáceis.
Pegando carona no texto da colega Marta Nobre, como desdizer a acusação do ex-presidente Jair Bolsonaro acerca de uma possível “ditadura do Judiciário?” A indagação de Bolsonaro é simples: “Como prender alguém sob a acusação de obstrução da investigação com o inquérito já concluído?”. Deve haver uma ou mais respostas. Que elas sejam dadas. A dúvida incomoda e cria novas dúvidas até mesmo em magistrados supostamente experientes da Corte. Por exemplo, qual será a razão lógica para os insistentes votos contrários dos ministros Nunes Marques e André Mendonça? Não quero crer que sejam apenas para afagar o dolorido ego do antigo mestre. Se for, o melhor a fazer é fechar as portas do tribunal e jogar as chaves fora.
Baseado no inquérito da PF, Alexandre de Moraes é categórico na afirmação de que houve crime. O Brasil inteiro concorda, inclusive os divergentes. De acordo com o ministro, há vasto conhecimento acerca do planejamento e de vários caminhões trucados de provas. Então, mesmo considerando o permissivo timing da Justiça, por que não tornar público o que realmente ocorreu. Deem à sociedade a oportunidade de opinar sem margem de erro. Quanto mais lenga lenga, mais dúvidas e muito mais questionamentos sobre o absolutismo do Poder Judiciário e de alguns de seus poderosos membros.
O golpe e os assassinatos não saíram do papel. Menos ruim. Sou absolutamente contrário à perda da liberdade. Por isso, minhas “diferenças” com Jair Bolsonaro. Até onde a gente sabe, o passo a passo da insurreição estava delineado, mas foi abortado exclusivamente por falta de apoio do Alto Comando das Forças Armadas. É plausível acreditar que generais e brigadeiros com viés democrático tenham evitado mal maior. Pois bem. Se estivemos mesmo à mercê de golpistas e não de bravateiros, que sejam definitivamente enumerados os fatos considerados basilares para garantir a eficácia e a segurança jurídica dos atos do ministro Xandão.
Reiterando minhas divergências ideológicas com o bolsonarismo, não há como discordar, à primeira leitura, da argumentação de que não há hipótese de se obstruir ou paralisar uma “obra” construída. Como me disse um renomado jurista, indícios ou presunções são insuficientes para justificar a perda de liberdade de qualquer ser humano, mormente um general quatro estrelas. Os anunciados riscos à investigação e as provas da obstrução não foram apresentados. Por quê? São inexistentes? Não sou defensor de ninguém. Muito pelo contrário. As perguntas conclusivas são simples. Consumada a prisão do general Braga Netto, o que resta a Xandão? Determinar a prisão de toda a antiga República? Ficar o dito pelo não dito? Botar a pizza no forno? Falta coragem ou elementos para acabar com esse cansativo folhetim? É dever da Justiça mostrar ao povo, com a rapidez exigida, em quem se deve confiar. A princípio, a dúvida nos leva a duvidar até do próprio Poder Judiciário. Que venham as respostas.
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*Mathuzalém Júnior é jornalista profissional desde 1978