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Zazá, o craque que nunca foi, leva apito final

Caso alguém perguntasse pelo Zaqueu, ninguém saberia dizer quem é. No entanto, bastava falar no Zazá para que o povo abrisse aquele sorriso.

— E quem não conhece o Zazá? Gente boa demais!

Além de boa-praça, o homem era apaixonado por futebol. Tanto é que, desde menino, sonhava em ser jogador de futebol. Todavia, se já não bastasse a ampla concorrência, o gajo era muito ruim de bola. Um verdadeiro pereba.

Até hoje não se sabe se Zazá tinha consciência da própria ruindade ou, então, se achava craque, mas era cheio de humildade. Tanto é que não perdia nenhuma partida do time da quadra, mesmo que fosse escalado para gandula. E lá ia o homem mostrar todo aquele preparo físico atrás da bola. Afinal, o jogo precisava ser reiniciado o mais rápido possível.

Todos os dias, antes do Sol dar as caras, era possível ver o rapaz correndo pelas ruas, sempre vestido a caráter para ser escalado para entrar em campo. Nunca foi, mas isso não importava. Como aprendera com o falecido avô, precisava estar preparado para quando a chance chegasse. E, geralmente, ela não costuma avisar antes de despontar no horizonte.

Pois bem, o improvável aconteceu justamente na final do campeonato, quando o time, desfalcado de dois titulares, parecia em maus lençóis. Para piorar, o banco de reservas estava vazio. Foi então que o treinador, temendo que seu time entrasse em campo com nove, olhou para o lado. Lá estava o Zazá de chuteira, meião e todo o uniforme da agremiação.

O comandante do time observou por um tempo aquele cara, cujo andar cambaleante até lembrava o do Garrincha. Só faltava estar com a camisa número sete. Surpreso, constatou que o gajo, até nisso, combinava com o gênio das pernas tortas. Não teve dúvida e gritou.

— Zazá, corre aqui!

Os olhos do rapaz brilhavam. Tudo indicava que, finalmente, ele iria realizar seu sonho de entrar em campo. Ainda mais depois que o treinador o mandou aquecer. E lá estava o Zazá pulando de um lado para outro, dando piques na beira do gramado, mas nada de receber o sinal.

A partida iniciou, o primeiro tempo terminou, veio o intervalo, depois a segunda etapa e, por fim, o juiz deu o último apito. Quanto ao Zazá, suando em bicas, não parecia decepcionado por não ter feito a sua tão esperada estreia, mas apenas pelo placar elástico que o time levou: 8 x 0.

Os anos voaram, e aquela goleada era sempre lembrada pelo Zazá, o craque que nunca havia pisado no gramado. Ele, orgulhoso, gostava de falar que o time se esforçou, correu, sem contar que jogar com apenas nove jogadores era algo heroico. Não parecia decepcionado por ter ficado aquecendo durante todo a partida. Tanto é que continuou apoiando o esquadrão da quadra durante décadas, até que, certo dia, durante mais uma final, ele não apareceu.

Todos estranharam a sua ausência. No entanto, como o jogo iniciou, os olhos se voltaram para o gramado. A pelota foi dura, mas o time local conseguiu vencer por um magro 1 x 0. Campeão! E eis que o Ricky Ricardo, o artilheiro da equipe, se lembrou do Zazá.

Não demorou, lá foi a galera na casa do mais notório personagem da região. Quando aquelas pessoas chegaram à porta da residência do Zazá, tocaram a campainha. Nada. Bateram palmas e gritaram o nome do morador. Nada. Até que o Ricky, movendo a maçaneta, constatou que a porta estava destrancada.

O homem, antes de entrar, ainda chamou pelo dono do local. Nenhuma resposta. Deu dois paços e, então, avistou o velho Zazá deitado no sofá. A televisão ligada em um canal de esportes. Ricky se aproximou, tocou aquele rígido e gélido corpo, trajado com o uniforme do time da quadra, quando constatou a única certeza de todos nós. Apito final.

*Eduardo Martínez é autor do livro “57 Contos e Crônicas por um Autor muito Velho”.

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