Período Jurássico
Zoo de São Paulo tem pegadas de feras pré-históricas
Publicado
emJosé Maria Tomazela
Além de abrigar centenas de animais, o Parque Zoológico de São Paulo guarda vestígios de espécies que viveram há 140 milhões de anos. Foi o que mostrou uma pesquisadora, ao identificar pegadas fósseis em 31 lajes de arenito no calçamento do zoológico.
Pietra Mori Micheletti, mestranda em Conservação da Fauna da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), achou vestígios de animais que habitavam o interior paulista no fim do período Jurássico e no início do Cretáceo. Nas lajes, foram identificados icnofósseis – rastros deixados em sedimentos que se transformaram em rocha.
As calçadas do zoológico paulistano foram feitas com lajes extraídas de uma pedreira de Araraquara, local de afloramento do maior deserto de dunas eólicas já existente no mundo. Esse ambiente, o paleodeserto Botucatu, era habitado por grande diversidade faunística, composta por dinossauros carnívoros e herbívoros, mamíferos e invertebrados que deixaram suas marcas preservadas.
A UFSCar defende a criação de um museu a céu aberto para expor as pegadas fósseis aos visitantes do zoo, na região do Ipiranga, zona sul da capital. “Vamos ter placas iguais às que indicam os animais, instaladas próximas de cada pegada, com informações sobre o animal ou organismo que a produziu”, sugere Pietra. A proposta ainda depende do aval da Fundação Parque Zoológico de São Paulo.
Segundo ela, como seus pais moram em São Paulo, em bairro perto do zoo, pretende continuar as pesquisas no local. “Há mais fósseis por lá. Havia uma laje com uma pegada importante, possivelmente de um dinossauro, que foi retirada do local em que estava. Sei que está em algum lugar, mas ainda não consegui localizar. Vou continuar procurando.”
Entre as pegadas, seis foram deixadas por dinossauros: quatro de celurossauros, carnívoros, e duas de ornitópodes, herbívoros.
Dentre as pegadas produzidas por mamíferos, foi possível identificar uma, por exemplo, de um mamífero de maior porte, o Aracoaraichnium leonardii.
Esse ancestral não aparecia em pesquisas anteriores sobre os fósseis do antigo deserto. Seus rastros foram descritos em trabalho recente, também feito na UFSCar, pelo doutorando Pedro Victor Buck.
Ele descobriu esse mamífero de maior porte em placas resgatadas da pedreira São Bento de Araraquara e das calçadas públicas de São Carlos. A placa que deu base à identificação foi achada ao lado de uma pizzaria. Os vestígios foram comparados com outros em placas de arenito e ficou provado que se tratava de um animal diferente daqueles já descritos.
O rastro – e, por extensão, a espécie ancestral que o produziu – ganhou o nome de Aracoaraichnium leonardii em homenagem à cidade e ao padre italiano Giuseppe Leonardi, pioneiro no estudo das lajes de arenito na região.
“Ainda tem muita coisa nos calçamentos dessas cidades, mas há sempre o risco desse material desaparecer numa reforma ou pelo desgaste natural da placa”, explica Marcelo Adorna Fernandes, professor do Departamento de Ecologia e Biologia Evolutiva da UFSCar e orientador dos dois pesquisadores.
A primeira pegada fóssil na região foi descoberta em 1911, em uma calçada de São Carlos, pelo engenheiro Joviano Pacheco. Ele retirou a placa e levou para o Instituto Geológico de São Paulo – o material foi analisado e descrito somente em 1931 pelo paleontólogo alemão Friederich von Huene, especialista em dinossauros.
Visitação. Não é a primeira vez que a história do zoológico se mistura com a exploração científica do passado. Em 2007, foi desenvolvido um guia de campo com ilustrações das pegadas fósseis existentes em algumas calçadas do parque, com enfoque nos dinossauros. Depois disso, nenhum outro trabalho foi feito com os icnofósseis.
Em setembro de 2014, foi inaugurada no zoo a exposição “O Mundo dos Dinossauros”, idealizada pela D32 Produções e Eventos, com 20 dinossauros robotizados em tamanho real. “As pegadas fósseis permitem ao visitante outra forma de interagir com o parque, possibilitando reflexões sobre as marcas que o ser humano está deixando para gerações futuras”, escreve Pietra, em sua dissertação de mestrado.